E abracei-te. Até à eternidade

Porque hoje é sábado
parei a pensar o que hoje pensei.
E abracei-te até à eternidade.

E abracei-te

Tenho apenas duas mãos e o sentimento do mundo.
Carlos Drummond de Andrade

Volteando entre aromas saborosos
em dia de primavera,
no meio da multidão,
restei só.
Estranhas criaturas
olhando os nadas,
a pé, caminheiras ou sentadas
disparavam gritos, afetos, gargalhadas,
perguntas sem resposta,
como quem busca a cura
para a sua solidão.
No meio da multidão
só os aromas da primavera
me tocaram, me olharam,
me acenaram num gesto de ternura,
me disseram num sorriso:
PASSE BEM.
Momento fugaz,
inebriante
que deu sentido
ao sonho dessa madrugada.

Ei-lo.

Virado em monitor,
com caracteres, ap´s
e uns quantos bytes,
vivendo primavera
qual pardal chilreando
no ramo colorido
do meu jardim,
eu virei sem perceber,
o ser essencial,
o único, o tudo
do nada à minha volta.
O ser irrepetível, o anjo,
o sedutor de toda a multidão.
Olhado com ternura,
beijavam-me, afagavam-me,
massajavam-me,
dedilhavam cada ponto
do meu corpo
como que a dizer-me
que não estava só.
Por vezes
os berros de ternura
descompunham-me as entranhas,
mas no meio da multidão
eu era o único. Em volta, nada mais.
Sonho lindo que findou
como tudo quanto é bom.

Na rotina da manhã seguinte,
descendo a calçada,
questionando ao metal
quantas perguntas sem resposta
como quem busca a cura
para a minha solidão,
parei para pensar.
Calei os bytes, os sussurros,
as gargalhadas.
Sorri ao parceiro que subia
a calçada que eu descia.
E ele parou. E olhou. E sorriu.
Paramos o trânsito.
E no meio da calçada
que eu descia e ele subia
demos um abraço singular,
único, irrepetível.
Até à eternidade.

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

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