Porque hoje é sábado
parei a pensar o que hoje pensei.
E vi renascer as estrelas.
No fundo de um buraco ou de um poço, acontece descobrir-se as estrelas.
Aristóteles
Já te aconteceu?
Olha que a mim também.
Era o dia
mais triste e mais longo
do meu existir.
Qual buraco negro
que sugava corpo e alma
para o abismo,
que virava ao avesso
projetos e promessas,
credos e crenças,
sonhos e entranhas.
Qual pesadelo
que tolhia
quanto era,
quanto queria,
quanto cria,
quanto amava.
De mãos a abanar
caminhava inseguro
sem rumo nem destino,
sem presente nem futuro,
por caminhos ignorados.
Logo já
dei por mim
sentado na areia molhada
ao entardecer.
Sem saber como nem porquê
olhei o meu poço por dentro.
Não lhe vi o fundo, negro como breu.
Fui-me deixando sentado por lá
como quem espera o nada ou o melhor,
o fim ou a redenção.
Foi-se o Sol. A noite caiu.
Olhei de novo
o meu poço por dentro.
Não lhe vi o fundo, negro como breu.
E parei, o parar para pensar.
Deixei-me embalar
no belo do nada, do vazio.
E adormeci.
Madrugada alta,
uma onda gigante,
qual tsunami,
invadiu o espaço profundo
onde eu sonhava.
E encharcou-me.
E lavou-me corpo e alma.
E purificou-me.
E redimiu-me.
Quantas histórias de encantar
foram lembradas.
Quantos momentos
de festa e de folia
borbulhadas.
Quantas rosas encarnadas
oferecidas.
Quantos poemas de amor
dedicados.
Quantas vezes fui Pai,
cada vez como a primeira
(que o pai tem os anos de cada filho
e por isso é sempre jovem).
E quantas avô
duma tribo que partilha
tropeços, sucessos,
desenganos, desatinos.
Quantas fotos nas paredes
repletas de recordações.
Quantas…Quantas…Quantas…
Olhei de novo
o meu poço por dentro.
Não lhe vi o fundo,
cheio que estava
de pedaços do céu.
E parei para pensar.
E vi renascer as estrelas
de dentro do meu poço.
Já te aconteceu?
Olha que a mim também.