Porque hoje é sábado,
parei a pensar o que hoje pensei.
E pensei no teu nome.
Olhei-te manhã cedo. Vi enfiares um camelo no buraco duma agulha.
Manuel Paulo em “Sem surpresa”.
Carta à minha amada
Cinquenta anos de amor.
É obra.
Busquei no baú
que guardo escondido
num canto
da minha memória
a palavra final.
A tal que sempre
sonhei existir.
Aquela palavra
que todo o poeta procura,
que encerra em si mesma
o tudo e o todo que sente
incapaz de exprimir.
Descobri-la seria
o fim de toda a loucura,
ferrolho do meu baú.
Vazei-o
até à última letra.
Montei
palavras sisudas,
ligeiras, profundas,
mesquinhas, chorudas,
sem achar
a palavra final.
E cansado, adormeci.
Manhã cedo,
acordando dum sonho ditoso
semelhante
ao que o Céu deve ser,
encontrei o teu nome
a tombar do baú
que guardo escondido
num canto da minha memória.
E fui feliz.
Encontrara a palavra final.
A tal que contém
o todo e o tudo que sinto
que sempre sonhei existir,
o tudo e o todo que sou
e que eu era incapaz de exprimir.